Aproveitando que em agosto é comemorado o Dia Nacional do Patrimônio Histórico, o IAB-BA promoveu um debate online sobre o significado da data no contexto estadual. A transmissão no dia 17 de agosto aconteceu pela Canal Filtro de Barro no youtube e pode ser assistida aqui.
Com moderação do presidente do IAB-BA, Luiz Antônio de Souza, a transmissão ao vivo _ Patrimônio em Movimento: Sentidos e Horizontes teve como convidados o arquiteto Paulo Ormindo de Azevedo, especialista em Conservação e Restauro de Bens Culturais pelo ICCROM/UNESCO, e coordenador de Inventario de Proteção do Acervo Cultural da Bahia, Clarindo Silva, líder comunitário e comerciante no Centro Histórico, Waldeck Ornelas, especialista em planejamento urbano-regional e ex-Sec. de Planejamento da Bahia e Zulu Araújo, atual diretor geral da Fundação Pedro Calmon – Secult/BA
Abrindo as considerações iniciais, Zulu trouxe como questão central o não reconhecimento da diversidade de contribuições, limitando o conceito de patrimônio histórico. “Ao considerarmos como patrimônio histórico apenas o que é material, edificado, é claro que somente a contribuição da elite da época, formado pelos colonizadores europeus e igreja católica, ganha visibilidade já que eram os únicos a possuir bens. É preciso ir além e valorizar o patrimônio imaterial, também histórico, construído por negros e índios”, afirma, acrescentando que esta visão leva a distorções como o fato que mais de 50% do patrimônio reconhecido pela UNESCO está na Europa e na América do Norte. Outro ponto salientado foi a falta de identidade de amplos segmentos da sociedade com o centro histórico.
Apontando outra distorção, Paulo Ormindo falou sobre a atual configuração do Centro Histórico, com foco no Pelourinho. Para ele, uma solução para preservação e revitalização é justamente o oposto do que foi feito na restauração do local na década de 90, do sec. passado com retirada quase completa dos moradores e quando foram investidos entre meados da década de 1970 e 2017, em torno de 225 milhões de dólares americanos. O arquiteto acredita que um caminho possível seria a autoconstrução a partir de qualificação dos moradores atuais para isto. “A inclusão habitacional e social dessas pessoas é ponto importante para a revitalização e é um desejo deles, que querem permanecer por lá, segundo pesquisa realizada pela FAU/UFBA”, afirmou. E foi enfático “Não se trata de autoria de projeto. Se trata de luta cidadã coletiva em defesa do nosso patrimônio maior, que está se arruinando por políticas voluntaristas, sem nenhum respaldo da experiência nacional e internacional”.
Essa visão é corroborada por Clarindo Silva, que desde os doze anos é frequentador do Pelourinho e fez histórico de seu apogeu até a década de 40, quando as famílias abastadas que ali moravam mudaram para bairros como Graça, Barra e Corredor da Vitória. Depois veio a saída da administração estadual e municipal da região, bem como de entidades importantes como a Faculdade de Medicina, o Instituto Médico Legal e a Academia Baiana de Letras, iniciando um período de decadência que, infelizmente, parece estar voltando com o foco do local apenas para o turismo após a revitalização.
Como mais um acréscimo à discussão, Waldeck Ornelas abordou a necessidade de que outros bairros que também fazem parte do conjunto arquitetônico do centro histórico ganhem projetos de revitalização – a exemplo da Lapinha, Saúde, Comércio e Barris – e encontrem um nicho para manterem-se em evidência, como aconteceu no Pelourinho em relação ao turismo em sua opinião. “O Santo Antônio parece ter encontrado o seu como bairro residencial, mas o Comércio já perdeu o lugar de coração financeiro de Salvador e precisa de investimentos públicos para achar seu novo caminho. Políticas públicas são essenciais para soluções de recuperação e preservação”, considera.
Waldeck convocou o IAB/BA, diante da proximidade dos 200 anos da Independência da Bahia, a associar-se ao SOS Soledade indicando ações para recuperação desta localidade, extensão do núcleo histórico, em estado considerável de degradação física. A transmissão foi encerrada com a confrontação de pontos de vistas dos debatedores e respostas aos questionamentos dos participantes.
Acesse Dossiê Parent citado na lives por palestrantes
Caso tenha interesse em aprofundar o tema, segue lista de estudos sobre o Pelourinho que podem enriquecer a discussão:
- IV ENCONTRO SIRCHAL, Seminário Internacional para a Revitalização de
Centros Históricos na América Latina e Caribe. Salvador, 29 de mai. a 02 de jun., 2000. Disponível em: <www2.archi.fr/SIRCHAL/seminair/sirchal4/ProgSalv.htm>, acesso em 25 ago. 2017.
2. AZEVEDO, Paulo Ormindo El Perourinho de Bahia, cuatro décadas despues.
In Quito: Icono, n. 20, Sep. 2004.
3. MIRANDA, Luciete: SANTOS, Maria Aparecida. Pelourinho: desenvolvimento
socioeconômico. Salvador: Secretaria de Cultura e Turismo, 2002.
4. MOURAD, L. N. Processos de gentrificação do Centro Antigo de Salvador 2000 a 2010. Salvador: Tese de doutorado em Arquitetura e Urbanismo). Faculdade de Arquitetura da UFBA, 2011a.
5. Seminário Urbanismo na Bahia [11], Salvador. PPGAU-UFBA, 2011b. Disponível em: <http: //www.ppgau.ufba.br/urba11/ST2_A_ VERDADEIRA_FACE_DO_ PROCESSO _DE_ REABILITACAO_DO_CENTRO_ HISTORICO_DE_SALVADOR.pdf>. Acesso em: 18 de maio de 2013.
6. REBOUÇAS, T. Costurando escalas: 7ª etapa de recuperação do Centro Histórico de Salvador. Programa Monumenta e BID. Salvador: Dissertação de Mestrado na Faculdade de Arquitetura da UFBA, 2012.
7. SANT’ANNA, Marcia. Da cidade-monumento à cidade-documento. Salvador: Oiti Editora, 2015.
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