Habitação no contexto de emergência climática em Salvador

Desde de 2020, tramita na Câmara de Deputados o Projeto de Lei 3961/20, cujo objetivo é reconhecer o estado de emergência climática no Brasil, “até que ações para reduzir o impacto da atividade humana no clima deixem de ser urgentes e necessárias”. O PL veio confirmar uma preocupação já manifestada pela Rede Convergência pelo Clima, atuando em Salvador e Região Metropolitana com a união de organizações, coletivos e movimentos sociais e, desde 2019, vêm pressionando por uma ação real pelo clima em todas as esferas do poder público.

Neste contexto, em parceria com o Movimento Canteiros Coletivos e com o Grupo Ambientalista da Bahia – Gambá, foi elaborado o projeto Emergência Climática em Salvador que tem entre seus objetivos a formação de multiplicadores em torno dessa temática por meio de discussões e rodadas de conversa. A última delas, aconteceu dia 30 de setembro e teve como tema Habitação e Clima em Salvador, contando com a mediação de Luiz Antônio de Souza, presidente do IAB-BA.

Luiz Antônio abriu destacando o grande desafio ambiental no cenário político atual e sobre a necessidade de uma percepção cada vez mais articulada do clima com questões como moradia/habitação diante de fatos frequentes como deslizamentos e inundações. Assinalou, referindo-se a carta encíclica papal LAUDATO SI – Sobre o Cuidado da CASA COMUM. “O nosso corpo é constituído pelos elementos do planeta: o seu ar nos permite respirar, e a sua água vivifica-nos e restaura-nos. Só não sabendo até quando se a necessidade urgente de uma mudança radical não ocorrerem no nosso comportamento como forma de proteger as nossas casas dentro da CASA COMUM”.

O primeiro convidado a falar foi Maura Cristina da Silva, do Movimento Sem Teto da Bahia (MSTB), abordando a importância da participação dos movimentos sociais nas decisões de planejamento urbano. “Essa ausência de consulta popular é extremamente prejudicial para todos em todos os aspectos e na habitação fica a pergunta para quem e por quem está sendo pensada? Porque com certeza não é para grande maioria que trabalha e sustenta a cidade morando em locais inadequados. Quem são os beneficiados por essa visão atual de política habitacional? Precisamos falar de especulação imobiliária e do descaso do direito à moradia digna para todos. Não basta pedir a população que saia de suas casas em períodos de chuva. Isso é varrer o problema para debaixo do tapete. Ninguém mora em lugar de risco por vontade”.

Em seguida, foi a vez de João Pereira, da Confederação Nacional das Associações de Moradores (Conam) apontar a relevância do debate clima-habitação diante da falta de habitualidade de grande parte da população de Salvador. Cabe ao estado essa solução. João fez um histórico de ações de política pública voltadas para moradia e dos poucos resultados conseguidos nessa trajetória, bem como em relação a políticas de emprego e renda e de estruturação.

Fechando a roda, Tiago Scher, da organização Teto Brasil, mostrou caminhos possíveis para uma gestão mais segura e justa para a moradia na capital baiana frente à vulnerabilidade da cidade em relação ao clima, à habitação e à condição social. “Trazer a perspectiva do morador das periferias ao processo de construção de uma política habitacional é essencial para um resultado positivo”. O debate foi aberto ao público pelo chat e encerrado com Luiz Antônio mostrando que o conceito de moradia de interesse social deve considerar especificidades mínimas que assegurem conforto e qualidade de vida.

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Projeto Emergências Climáticas

Para aprofundar mais o debate em torno do tema, Renato Cunha, do Grupo Gambá, fala sobre o Projeto Emergências Climáticas em entrevista para o IAB-BA.

 

Em que consiste o Projeto Emergências Climáticas?

São três objetivos básicos que pretendemos cumprir – formar pessoas, acompanhar e contribuir com o plano de Adaptação e Mitigação de Mudanças Climáticas de Salvador da Prefeitura para que seja participativo realmente e elaborar uma plataforma ambiental para os candidatos a prefeitos e vereadores nas próximas eleições.

Quais seriam as principais medidas a serem tomadas pela Prefeitura?

Consideramos que a Prefeitura e o Governo deveriam rever vários projetos na cidade que têm impacto ambiental como tamponamento de rios e supressão de vegetação. Não há respeito as áreas verdes na maioria dos projetos.

Também precisa ser repensada a participação popular tanto no Plano Municipal de Mata Atlântica em elaboração, quanto no Conselho Municipal de Meio Ambiente, que está na mão do setor empresarial.

Quais os principais impactos do clima na moradia digna?

Moradia digna é qualidade de vida. Habitação é direito humano.  Quanto essas premissas são desconsideradas, acontece a ocupação indevida de espaços pela população carente prejudicando o meio ambiente diante de uma política habitacional séria e comprometida com o desenvolvimento da cidade.

Como a população pode participar da consulta pública do Plano de Adaptação e Mitigação de Mudanças Climáticas de Salvador (PMAMC)?

Infelizmente, não tem sido participativo. As consultas virtuais só permitem perguntas por chat, sem viabilizar debate e apresentação de argumentos técnicos. A expertise dos profissionais das entidades de Salvador nessa área não tem sido aproveitada. A equipe do Plano é de fora da Bahia, de MG, e desconhece o modus operandi da cidade. A próxima consulta, dia 5 de outubro, é virtual também e com comentários por formulário.